quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Um poema do caralho


Nessa era do funk-silabada e do fast food baiânico-musical, declinou-se a letra enquanto fato e conceito. E isso é retrocesso. Tanto que, um escritor de best seller, no séc XIX (autor também da xaroposa e algodão doce- A escrava Isaura), apenas perfunctoriamente letrado, escrevendo sobre o caralho (o próprio, imagina-se, mas se for - e é - sobre o alheio, sem preconceitos, porra!!!), ultrapassa qualquer dessas porcarias cariocas (também, sem preconceitos, apenas conceito de forma e conteúdo) que se ouvem por aí. Sintam-no metrificado, pensando melhor, leiam-no e julguem.

O elixir do pajé

Que tens, caralho, que pesar te oprime
que assim te vejo murcho e cabisbaixo
sumido entre essa basta pentelheira,
mole, caindo pela perna abaixo?

Nessa postura merencória e triste
para trás tanto vergas o focinho,
que eu cuido vais beijar, lá no traseiro,
teu sórdido vizinho!

Que é feito desses tempos gloriosos
em que erguias as guelras inflamadas,
na barriga me dando de contínuo
tremendas cabeçadas?

Qual hidra furiosa, o colo alçando,
co'a sanguinosa crista açoita os mares,
e sustos derramando
por terras e por mares,
aqui e além atira mortais botes,
dando co'a cauda horríveis piparotes,
assim tu, ó caralho,
erguendo o teu vermelho cabeçalho,
faminto e arquejante,
dando em vão rabanadas pelo espaço,
pedias um cabaço!
Um cabaço! Que era este o único esforço,
única empresa digna de teus brios;
porque surradas conas e punhetas
são ilusões, são petas,
só dignas de caralhos doentios.

Quem extinguiu-te assim o entusiasmo?
Quem sepultou-te nesse vil marasmo?
Acaso pra teu tormento,
indefluxou-te algum esquentamento?
Ou em pívias estéreis te cansaste,
ficando reduzido a inútil traste?
Porventura do tempo a dextra irada
quebrou-te as forças, envergou-te o colo,
e assim deixou-te pálido e pendente,
olhando para o solo,
bem como inútil lâmpada apagada
entre duas colunas pendurada?

Caralho sem tensão é fruta chocha,
sem gosto nem cherume,
lingüiça com bolor, banana podre,
é lampião sem lume
teta que não dá leite,
balão sem gás, candeia sem azeite.

Porém não é tempo ainda
de esmorecer,
pois que teu mal ainda pode
alívio ter.

Sus, ó caralho meu, não desanimes,
que ainda novos combates e vitórias
e mil brilhantes glórias
a ti reserva o fornicante Marte,
que tudo vencer pode co'engenho e arte.
Eis um santo elixir miraculoso
que vem de longes terras,
transpondo montes, serras,
e a mim chegou por modo misterioso.

Um pajé sem tesão, um nigromante
das matas de Goiás,
sentindo-se incapaz
de bem cumprir a lei do matrimônio,
foi ter com o demônio,
a lhe pedir conselho
para dar-lhe vigor ao aparelho,
que já de encarquilhado,
de velho e de cansado,
quase se lhe sumia entre o pentelho.
À meia-noite, à luz da lua nova,
co'os manitós falando em uma cova,
compôs esta triaga
de plantas cabalísticas colhidas,
por sua próprias mãos às escondidas.
Esse velho pajé de pica mole,
com uma gota desse feitiço,
sentiu de novo renascer os brios
de seu velho chouriço!

E ao som das inúbias,
ao som do boré,
na taba ou na brenha,
deitado ou de pé,
no macho ou na fêmea
de noite ou de dia,
fodendo se via
o velho pajé!
Se acaso ecoando
na mata sombria,
medonho se ouvia
o som do boré
dizendo: "Guerreiros,
ó vinde ligeiros,
que à guerra vos chama
feroz aimoré”
assim respondia
o velho pajé,
brandindo o caralho,
batendo co'o pé:
Mas neste trabalho,
dizei, minha gente,
quem é mais valente,
mais forte quem é?
Quem vibra o marzapo
com mais valentia?
Quem conas enfia
com tanta destreza?
Quem fura cabaços
com mais gentileza?"

E ao som das inúbias,
ao som do boré,
na taba ou na brenha,
deitado ou de pé,
no macho ou na fêmea,
fodia o pajé.
Se a inúbia soando
por vales e outeiros,
à deusa sagrada
chamava os guerreiros,
de noite ou de dia,
ninguém jamais via
o velho pajé,
que sempre fodia
na taba na brenha,
no macho ou na fêmea,
deitando ou de pé,
e o duro marzapo,
que sempre fodia,
qual rijo tacape
a nada cedia!
Vassoura terrível
dos cus indianos,
por anos e anos,
fodendo passou,
levando de rojo
donzelas e putas,
no seio das grutas
fodendo acabou!
E com sua morte
milhares de gretas
fazendo punhetas
saudosas deixou...
Feliz caralho meu, exulta, exulta!
Tu que aos conos fizeste guerra viva,
e nas guerras de amor criaste calos,
eleva a fronte altiva;
em triunfo sacode hoje os badalos;
alimpa esse bolor, lava essa cara,
que a Deusa dos amores,
já pródiga em favores
hoje novos triunfos te prepara,
graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!

Vinde, ó putas e donzelas,
vinde abrir as vossas pernas
ao meu tremendo marzapo,
que a todas, feias ou belas,
com caralhadas eternas
porei as cricas em trapo...
Graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!

Sus, caralho! Este elixir
ao combate hoje tem chama
e de novo ardor te inflama
para as campanhas do amor!
Não mais ficará à-toa,
nesta indolência tamanha,
criando teias de aranha,
cobrindo-te de bolor...

Este elixir milagroso,
o maior mimo na terra,
em uma só gota encerra
quinze dias de tesão...
Do macróbio centenário
ao esquecido mazarpo,
que já mole como um trapo,
nas pernas balança em vão,
dá tal força e valentia
que só com uma estocada
põe a porta escancarada
do mais rebelde cabaço,
e pode em cento de fêmeas
foder de fio a pavio,
sem nunca sentir cansaço...

Eu te adoro, água divina,
santo elixir da tesão,
eu te dou meu coração,
eu te entrego a minha porra!
Faze que ela, sempre tesa,
e em tesão sempre crescendo,
sem cessar viva fodendo,
até que fodendo morra!
Sim, faze que este caralho,
por tua santa influência,
a todos vença em potência,
e, com gloriosos abonos,
seja logo proclamado,
vencedor de cem mil conos...
E seja em todas as rodas,
d'hoje em diante respeitado
como herói de cem mil fodas,
por seus heróicos trabalhos,
eleito rei dos caralhos!

GUIMARÃES, Bernardo. O elixir do pajé, apud http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/elixir.html)

Marginais magistrais

Manifesto obsoneto [1981]


Isso não é poesia que se escreva,
é pornografia tipo Adão & Eva:
essa nunca passa, por mais que se atreva,
do que o Adão dá e do que a Eva leva.


Quero a poesia muito mais lasciva,
com chulé na língua, suor na saliva,
porra no pigarro, mijo na gengiva,
pinto em ponto morto, xota em carne viva!


Ranho, chico, cera, era o que faltava!
Sebo é na lambida, rabo não se lava!
Viva a sunga suja, fora a meia nova!


Pelo pêlo na boca, jiló com uva!
Merda na piroca cai como uma luva!
Cago de pau duro! Nojo? Uma ova!


(MATOSO, Glauco, apud http://maripontequieta.blogspot.com/2007/04/poesia-suja.html)

domingo, 26 de agosto de 2007

Trocadilho visual: mapa cognitivo, traduzindo relações entre o gregário e o monumental no intempestivo circunstante.

O limite e o infinito nas escalas gregária e monumental em que se circunscrevem a taba e a tribo discutem as relações de conforto e desconforto nas referências de valores cósmicos: o dentro e o fora.

Apenas a arquitetos e urbanistas poetas se permitem estados de maluquez, meditações baratinadas e a imprevisibilidade da leitura de suas obras. Arquitetos e urbanistas prosistas têm de ser, se não responsáveis técnicos, ao menos previsíveis.

Essa chuva caindo no horizonte do provável não constitui uma mera lembrança das precipitações brasílico-equinociais, mas evoca uma cena de Eisenstein. Arquitetura e Poesia.

sábado, 25 de agosto de 2007

Obra aberta: uma narrativa que se organiza no mundo ou um mundo que se organiza numa narrativa?

PG, “PARA UMA COLETA RELAÇÃO”, OU UM FANTASMA DO AMOR

Eles o viram num quiosque do calçadão de Camburi. Cumprimentando-o, chamaram-no, íntimos, de PG. Carmelo Merzzo nada entendeu; em que podia servi-los, não tomavam uma cerveja? Eles riram: “mas há muito tempo, nós quase fomos uma família, não se lembra? Eu sou a Landi Phanuti, e este é o meu irmão, Hidovani Phanuti”. PG se lembrou enquanto balançava a cabeça, embasbacado, mas isso fora há 20 anos, porra, como o reconheceram?

(Naquele tempo, era atlético como um soldado romano; agora, grisalho como um urso, mas, com aquela sunga branca de praia, ele ficava inconfundível para quem já o conhecera na intimidade. Nascera em Pau Grande, RJ, e essa toponímia se lhe imprimira, com méritos, nos órgãos genitais. Até Joça, o alfaiate, que o a-do-ra-va – escandia o verbo e, num êxtase à Santa Teresa, revirava os olhos –, chamava-o de PG, que, agora, era um 50tão bem casado. Sóbrio, não se lembrava de ter tido relações homoeróticas, não por falta de oportunidade, mas por excesso de macheza!)

Zonzo com aquele brusco recuo da memória no tempo, olhou o relógio e, fingindo importância profissional, pediu a conta. Caralho, hora de sair! Tinha um montão assim de serviço no escritório, andava sem tempo pra coçar o saco; agradecia por terem-no reconhecido e cumprimentado; a mãe ia bem? Deixassem aí um número de celular! Não tinham uma caneta? Tudo bem, memorizava qualquer coisa; numa horinha dessas, ligava, falou? Balangou a mão, parando o 523 e embarcando numa dupla viajem: no espaço, até ao Terminal de Laranjeiras; no tempo, até ao verão de1987.

Sua amizade com Landi Phanuti durara 12h e R$ 30, 00 (moeda atual) – débito contraído no Bar Carola, próximo da casa dela, em Itacibá. Conhecera-a numa discoteca, no Cobilândia Futebol Clube, e assim que a viu, pensou: “se eu pudesse, amá-la-ia sempre”. Tocavam Dudu França. Ali, ela dançava só; Carmelo, também. Ele a convidou para fumarem lá fora. Ela foi.

Antes não fosse, disse, ele agora, passando em frente ao Motel Taiti.

Agarrara-a ali mesmo, na varanda do clube. Movidos pelo romantismo a granel que as músicas derramavam, beijavam-se, mordiam-se e roçavam-se. Nisso, um rapaz de uns 15 anos, branco, rechonchudo como um anjo barroco, dera-lhe uma tapinha no ombro. Carmelo virara-se, e Hidovani vendo-lhe a braguilha vultosa, olhou para o teto: que falta de vergonha! A mana era moça de família; com licença, iam embora; ambos deviam chegar a casa no máximo às 23h. Num ato a um tempo cúmplice e viril, Carmelo abraçou-o paternal, porém, firmemente de lado, mas, involuntáriamente, suas “coisas” tocavam a coxa esquerda do jovem. “Mas já são 22h30min e olha a chuva que começou a cair!” Iriam pra onde mesmo? Não lhes poderia oferecer uma carona, o carro tava logo ali – Carmelo apontava para um Fiat 147 TL, de cor azul.

No trajeto, silêncio. Phanuti e Hidovani o intrigavam. Quando eles chegaram a casa, uma coroa os esperava na varanda. Chovia!

“Entrem, senão pegam uma gripe nesse aguaceiro. Mãe, esse é Carmelo: prazer, Nuves Phanuti”. Nossa, que paragrama!, (ele pensou). Tomassem banho já! Carmelo e Hidovani, juntos, no banheiro social; Phanuti, na suíte; tirassem logo as roupas encharcadas; “filho, vê um calção pro moço”; agradecia por lhe trazer os filhos, não ia deixá-lo sair naquele temporal; dera no rádio que tava tudo alagado em São Torquato; dormisse ali, no quarto de visitas; faria algo para que beliscassem; ah, tinha vinho na geladeira.

Naquele Box de 0,90m x 1,20m, com apenas um chuveiro, anfitrião e visitante se revezaram em constrangimentos e olhares oblíquos. Carmelo, ainda meio excitado com Landi Phanuti, não se arrefecia ante Hidovani, nu, com aquela pele quase rosada... Machos, falaram sobre o Flamengo, fazendo um grande esforço pra não parecerem frescos. Foram para a mesa à luz de velas. Um raio interrompera o fornecimento de energia. Bebiam e comiam; os pés de Carmelo roçavam os de Phanuti, e aquele calção de Hidovani só fazia acentuar-lhe os dotes, quando se erguia para ir mijar.

Ele nunca soube se adormecera; intuía que fora o último a se deitar; apagara a luz, mas a porta do quarto ficara aberta; estava bêbado; fazia calor; usava apenas um calção branco. Da cama, olhava o fulgor intermitente dos relâmpagos que alumiavam, através de uma báscula, o pequeno cômodo, e ouvia os trovões que já soavam distantes. Dormira pensando em Phanuti, na simpatia sexy da mãe, Nuvens, e na pele de lírio do Hidovani, mas fantasiava isto: ou Phanuti ou Nuves entrando silenciosamente pelo quarto, fechando a porta e se deitando sobre ele.

Acordou. Puta que o pariu, que ressaca! Fazia frio; lembrou-se de que havia sonhado e gozado. Esforçava-se para reconstituir os detalhes. Procurou vestígios de porra no calção, nada; na cama, tampouco. Estava encafifado. Às 9h, o café. Era sábado, pra que a pressa, ficasse para o almoço; ”você é engenheiro? Ajude os meninos com as lições de matemática”. Namorar Phanuti, ela não deixava: a moça já era prometida a um rapaz de São Mateus, mas gostaria de tê-lo como amigo. Era viúva, livre. Iria à feira; logo tava de volta pra fazer o almoço.

Carmelo dissera à Phanuti que sonhara. Fora ótimo. Ela não teria, cobrindo-se com um lençol branco da cabeça aos pés, ido de madrugada até à cama dele? “Eu”!? Até quereria, mas o irmão a vigiava constantemente do quarto ao lado do de visitas. Carmelo vestiu as roupas ainda úmidas e foi ao Bar Carola. Esquecera-se da carteira. Buscá-la-ia. “Não, o senhor paga depois; não é amigo de dona Nuves?”

Tomou 3 cervejas e pediu 7 para levar. Refletia... Como chupava bem aquela boca quente e úmida sob aquele lençol branco! Gozara duas vezes...Amava, mas a quem: Landi ou Nuves Phanuti? Pensava... Ah, lembrara-se de que seu amor usava meias brancas; andara silente à noite. Voltou a casa; dona Nuves, também. O frio aumentara. Na cozinha, todos usavam tênis e meias, mas somente as de Hidovani eram brancas.

Agora, em Laranjeiras, Carmelo pensou: trabalho, casa ou praia. Para onde? Sabia que volveria àquele quiosque. E foi.

Literatura, Arquitetura e Outros Sistemas de Significação (LAOSS)

Uma singela homenagem ao romântico e rural Paizinho do Ibiraçu: historiador e filósofo.










CREPÚSCULO SERTANEJO

A tarde morria! Nas águas barrentas
As sombras das margens deitavam-se longas;
Na esguia atalaia das árvores secas
Ouvia-se um triste chorar de arapongas.

A tarde morria! Dos ramos, das lascas,
Das pedras, do líquen, das heras, dos cardos,
As trevas rasteiras com o ventre por terra
Saíam, quais negros, cruéis leopardos.

A tarde morria! Mas funda nas águas
Lavava-se a galha do escuro ingazeiro...
Ao fresco arrepio dos ventos cortantes
Em músico estalo rangia o coqueiro.

Sussurro profundo! Marulho gigante!
Talvez um — silêncio!... Talvez uma — orquestra...
Da folha, do cálix, das asas, do inseto...
Do átomo — à estrela... do verme — à [ floresta!...

As garças metiam o bico vermelho
Por baixo das asas, — da brisa ao açoite —;
E a terra na vaga de azul do infinito
Cobria a cabeça co'as penas da noite!

Somente por vezes, dos jungles das bordas
Dos golfos enormes, daquela paragem,
Erguia a cabeça surpreso, inquieto,
Coberto de limos — um touro selvagem.

Então as marrecas, em torno boiando,
O vôo encurvavam medrosas, à toa...
E o tímido bando pedindo outras praias
Passava gritando por sobre a canoa!...

(ALVES, Castro. A cachoeira de Paulo Afonso, 1876, apud http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet159.htm)